domingo, 13 de abril de 2014

Que memória, depois, guardarei eu deste tempo?

 
Kasparov (outra vez ele) falou de memória e de fantasia. E, claro, também do tempo.
Sem as querer anular, acho sempre que a fantasia também é (porque se faz de) memória e que a memória é, numa boa parte, fantasia.
Podia ficar a faltar o tempo mas, desse, pode apenas apropriar-se a memória.
É pouco - como a carne. Mas já é alguma coisa.
 
Devo andar criativo...
- o que, evidentemente, não é bom: pelos desassossegos e pela abundância nefasta de vírgulas.

 

sexta-feira, 4 de abril de 2014

O tempo e a música

 
 
 
Dizem - digo eu, pelo menos - que a música tem a singular propriedade, verdadeiramente única, de ser capaz de nos transportar no tempo, fazendo-nos sentir, depois de certo tempo ter passado, exactamente como sentíamos certas coisas num outro tempo.
Visceralmente.
 
Não se trata de um efeito inteiramente voluntário, porque resulta apenas - ao menos inteiramente - quando a música em questão está um certo tempo (outra vez o tempo...) sem ser ouvida.
 
Todavia, o efeito pode ser parcialmente voluntário (ou até induzido), pese embora isso seja certamente abnorme: podemos passar x anos sem ouvir certo tema para que depois possamos sentir, num momento futuro, o que cá atrás sentíamos (e como, cá atrás, o sentíamos).
 
Todos sabemos que este se trata de um efeito maravilhoso (porque realmente mágico) mas que, decerto, é conhecido e experimentado por muitos (e eu acrescento: ainda bem!).
 
Fenómeno diferente (e, para mim, desconhecido até há bem pouco tempo) é um outro.
Refiro-me à música de que sempre moderadamente gostámos mas à qual, por uma ou outra razão, nunca ligámos muito e que, um dia qualquer, também por razão alguma, nos toma de assalto e nos esmaga por, de repente, a acharmos monumental.
A música "não nos diz nada" (isto é: não opera em nós o efeito que primeiramente descrevi porque, como música, era insignificante) mas passa, subitamente, a dizer-nos muito, sem que possamos compreender porque nunca nos tinha dito nada.
Qual metamorfose, é uma outra propriedade assombrosa. Também por ser - esta sim - integralmente alheia à nossa vontade.
E talvez também porque, num exercício maquinal, logo nos damos conta de que projectamos que a mesma música - velha e por nós conhecida, mas só agora verdadeiramente por nós descoberta - nos poderá transportar, num momento futuro, cá para trás.
Quando quisermos.
 
Abril de 2014