sábado, 19 de setembro de 2015

A casta (e o "calem-me esse filho da...")

No post abaixo, está retratado um episódio belíssimo da campanha para as presidenciais de 1986.

Soares - goste-se ou não dele - foi uma personagem incontornável da história política do país. Mas também o exemplo vivo de uma certa forma de fazer política - que só pode ser compreendida à luz do seu tempo.

Há muitas coisas que, no futuro, serão discutidas sobre Soares. Da importância da Fonte Luminosa ao descalabro da sua última aventura presidencial, em que Alegre o aniquilou.

Soares é, de resto, um exemplo flagrante dos malefícios da recusa em sair de cena no tempo certo. 


Tivesse Soares sabido resistir à tentação de se candidatar a deputado europeu (atrás da hipótese - que sabia perdida - de se tornar presidente do Parlamento Europeu) e, depois, a um terceiro mandato como Presidente da República, e a história que se escreverá sobre ele seria diferente.

Soares, na hipótese de ter saído a tempo da cena política activa, seria hoje um senador quase unânime que não é. E com uma influência praticamente imbatível, que delapidou.

Mas o que o episódio relatado abaixo por Henrique Monteiro retrata (o célebre "Calem-me esse filho da puta") vai muito para além de Soares. Como a cena em que o mesmo Soares, já presidente, diz a um guarda republicano que vá para casa.



É que Soares, nesta parte, representa uma certa casta.
Uma casta muito particular que sempre se reclamou de "esquerda" e que ainda hoje existe em Portugal.
Uma casta pedante, supostamente intelectual, convencida de que detém um direito natural a mandar nos outros (que são sempre uns "parolos", sem direito a abrir a boca).

Esta casta é normalmente senhora de uma ignorância insuportável (não é o caso particular de Soares) mas, sobretudo, de uma ilimitada soberba sobre os outros, a qual assenta, quase sempre, numa preguiça irresponsável feita de uma inutilidade total para trabalhar sequer um segundo.

Esta casta sempre existiu em Portugal.
São supostamente tolerantes para com os outros (na verdade, suportam-nos), e dizem-se munidos dos valores da "esquerda". Da sua esquerda, claro - a que lhes interessa: sem o fedor dos trabalhadores.

Não é Soares que me importa. São os que, ainda hoje, vivem exactamente do modo que ele representou. E que - para sermos justos - são muitíssimo piores do que ele.