terça-feira, 28 de abril de 2015

Se / Kipling / trad. Felix Bermudes

Se...

Se podes conservar o teu bom senso e a calma
Num mundo a delirar para quem o louco és tu...
Se podes crer em ti com toda a força de alma
Quando ninguém te crê...Se vais faminto e nu,

Trilhando sem revolta um rumo solitário...
Se à torva intolerância, à negra incompreensão,
Tu podes responder subindo o teu calvário
Com lágrimas de amor e bençãos de perdão...

Se podes dizer bem de quem te calunia...
Se dás ternura em troca aos que te dão rancor
Mas sem a afectação de um santo que oficia
Nem pretensões de sábio a dar lições de amor...

Se podes esperar sem fatigar a esperança...
Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho...
Fazer do pensamento um arco de aliança,
Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho...
Se podes encarar com indiferença igual

O triunfo e a derrota, eternos impostores...
Se podes ver o bem oculto em cada mal
E resignar sorrindo o amor dos teus amores...
Se podes resistir à raiva e à vergonha

De ver envenenar as frases que disseste
E que um velhaco emprega eivadas de peçonha
Com falsas intenções que tu jamais lhes deste...
Se podes ver por terra as obras que fizeste,

Vaiadas por malsins, desorientando o povo,
E sem dizeres palavra, e sem um termo agreste,
Voltares ao princípio a construir de novo...
Se puderes obrigar o coração e os músculos

A renovar um esforço há muito vacilante,
Quando no teu corpo, já afogado em crepúsculos,
Só exista a vontade a comandar: Avante...
Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre...

Se vivendo entre os reis, conservas a humildade...
Se inimigo ou amigo, o poderoso e o pobre
São iguais para ti à luz da eternidade...
Se quem conta contigo encontra mais que a conta...

Se podes empregar os sessenta segundos
Do minuto que passa em obra de tal monta
Que o minuto se espraie em séculos fecundos...
Então, oh ser sublime, o mundo inteiro é teu!

Já dominaste os reis, o tempo e os espaços!
Mas, ainda mais além, um novo sol rompeu,
Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos.
Pairando numa esfera acima deste plano,

Sem receares jamais que os erros te retomem,
Quando já nada houver em ti que seja humano,
Alegra-te, meu filho, então serás um Homem!...”
"If..." - Rudyard Kipling