quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Eduardo Barroso no "Prolongamento" da TVI24

Os intermináveis programas televisivos em que se discute afincadamente sobre bola inundam os nossos canais televisivos: que me lembre, muito rapidamente, há o "dia seguinte" na SICN, o "trio de ataque" na RTPN, o "prolongamento" na TVI24, o "mais futebol" na TVI, o "tempo extra" na SICN (este em versão de monólogo, de Rui Santos) e, certamente, haverá mais alguns.
Só à conta dos que citei, contabilizo aproximadamente 7 horas de emissão semanal.

Algum problema? Nenhum. São horas a fio, que só vê quem quer, em que se discute sempre a mesma coisa, com os mesmos argumentos.
Há programas em que os próprios comentadores confessam que não viram os jogos que servem de tema ao programa da semana. Mas discutem na mesma. Os lances, os árbitros, o sistema, a personalidade de quem manda nos clubes, os treinadores, as transferências. Tudo ao mais ínfimo pormenor, num estilo politicamente correcto doentio (do estilo: "esperemos que esta semana todos os clubes portugueses façam bons resultados na UEFA", "é importante que o Sporting recupere desta fase para a saúde do futebol português", etc.).

Não tenho rigorosamente nada a opor a este formato televisivo. Sempre que posso, vejo. Relaxa-me imenso, à excepção dos momentos em que as discussões pretendem ter uma dignidade a que não podem almejar: é insuportável, por exemplo, quando se gastam largos minutos a discutir o regime jurídico das Federações, ou os efeitos da "Lei Bosman" (que não é uma lei). Não é para isso que estes programas servem: servem, isso sim, para discutir "bola". Ponto final, parágrafo.

Ultimamente, o marasmo tem invadido estes espaços.
Rui Santos é insuportável. Na vaidade, no pretensiosismo. Na banalidade da análise, mesmo tratando dos assuntos que trata. Em suma: uma prosápia inaudível, de gosto mais do que duvidoso.
No "Trio de Ataque", só me divertem os dislates de António Pedro Vasconcelos e a chacina a que se presta por banda de Miguel Guedes, que invariavelmente o trucida. Mas é um espectáculo demasiado cruel para entreter. Quanto a Rui Oliveira e Costa, só me deleitam os constantes pontapés no português que julga que fala bem: já disse inúmeras vezes "façamos aqui um supônhamos" e repete incessantemente "Percebestes? Compreendestes?". A seguir, com ar pomposo, goza com Jesus porque este "não sabe comunicar". Enfim, para um sindicalista com tiques de visconde, não está mal.
No "Dia Seguinte", já só tem piada o frenesim entre Rui Gomes da Silva e Guilherme Aguiar quando o Benfica ameaça o FCP e Guilherme Aguiar se enerva. Como o Benfica tem ganho pouco (ou nada), pouco de interessante tem havido para ver. Sobra Dias Ferreira, o "grande homem", que tem perdido toda a piada e interesse desde que vestiu uma pele mais pacífica e institucional: efeitos da postura "presidenciável" que assumiu desde a última corrida à liderança do SCP.

Já no "Prolongamento" da TVI24 há Seara, Eduardo Barroso e Manuel Serrão (que substituiu, há uns tempos, o malogrado Pôncio Monteiro).
Seara está igual a si próprio: esperto, sabe que interessa dizer o mínimo, não hostilizar os outros e esperar que o ar de avôzinho simpático lhe continue a render o mediatismo acumulado ao longo de todos estes anos. Seara sabe que "é quem é" à custa destes formatos televisivos. Não está lá, por isso, por causa do Benfica. Está lá, única e simplesmente, por causa dele próprio. O que é um tédio, para quem está a ver (até porque a personagem tem zero de aliciante e menos ainda de estimulante).
A dinâmica do programa é, assim, assegurada pela tensão constante entre Eduardo Barroso e Manuel Serrão.
Sobre o último, interessa dizer que dá gozo vê-lo porque discute bola em televisão como se dicute bola no café. Boçalmente, às vezes com piada, num estilo jocoso, sempre à procura de amesquinhar o adversário. Não tem teorias pretensiosas, é o adepto puro. É isto que se quer, apesar do personagem ser incomodativo. Especialmente, para quem é do Benfica, como eu.


O antagonista de Serrão é Eduardo Barroso.
Barroso é fabuloso e é dele que me apetece falar.
Barroso berra com Serão e diz-lhe, autoritariamente, que o interrompe "quando quiser".
Barroso faz notar a Serrão que troca os "v"'s pelos "b"'s.
Barroso é sincero e emotivo. Enfurece-se e exalta-se. Mas também se comove e pede desculpa. É uma personalidade completa, feita, pois, da inerente complexidade.

Os tiques autoritários e de arrogância vai buscá-los a uma vaidade - que não esconde, mas daí não vem mal ao mundo - de ser um dos melhores médicos da Europa. Por isso manda calar Serrão, quando perde a cabeça, e berra descontroladamente com Seara, quando perde as estribeiras. Barroso está-se nas tintas, porque não depende dos programas televisivos sobre bola para nada. Por issso, desfruta-os. No seu melhor: está ali para vibrar, como nas bancadas de Alvalade, pelo "seu" Sporting. E isso diverte. Pela inteligência e pela autenticidade.
 
Eduardo Barroso sabe que percebe pouco de bola. A ele basta-lhe saber que é golo quando a bola entra na baliza e compreender a regra do fora de jogo. Sabe poucos nomes de árbitros (mas chama-lhes todos os nomes), não faz ideia do que uma equipa deve fazer em campo. Mas está-se borrifando, e bem. O que lhe interessa é a glória do seu clube, semana a semana.
Depois, Barroso sabe que sofre de uma malapata cruel: ser do Sporting. E compraz-se com isso, num exercício divinal de comoção passional e inteligência emocional. É por isso que tem insistido na tese de que os árbitros, antes de apitarem o Sporting, deviam consultar um psicanalista, de modo a contrariarem o seu subconsciente, que malevolamente os leva a prejudicarem o Sporting. Barroso diz isto a sorrir (mas convictamente), juntando vários argumentos e exibindo lances que servem de prova à sua teoria. Várias vezes, para estupefacção de Serrão, que se inquieta. É brilhante...sugere-lhes até o especialista, seu colega, a quem deveriam recorrer.
Mas bom, bom, é o desprezo que o próprio Barroso já não esconde pelo formato do programa: o que ele quer é divertir-se e, com isso, diverte-me imenso. Um exemplo? O do último programa: "Eduardo, o que achou do jogo da selecção nacional contra Chipre?". Resposta, com ar matreiro e um sorriso genuíno: "Uma merda. O jogo foi uma merda". A verdade no seu estado mais puro, dita com as palavras de um adepto. Que não precisa de se dar ares intelectualóides para sobreviver. Que está ali como está na bancada: sabendo pouco ou nada de bola, vibrando pelo seu clube.

Quando tirarem Eduardo Barroso dali (vai haver, aposto, algum iluminado que se indignará com o seu jeito politicamente incorrecto - neste pobre país é sempre assim) acaba o programa. No seu género, é o último que resta.