segunda-feira, 4 de abril de 2016

SOBRE AS VIRTUDES DO AFASTAMENTO DO PCP EM RELAÇÃO AO ESTALINISMO


Num tópico facebookiano de Bruno Abreu em que se reflectia sobre a não condenação do PCP em relação aos desmandos da "justiça" angolana, a conversa acabou por fluir para o estalinismo do PCP.
Deixei isto lá escrito (que agora editei), perante a defesa da tese segundo a qual o PCP se afastou, há muito, do estalinismo:

"Claro que o afastamento (mitigado) do PCP em relação ao Estalinismo tinha que acontecer. E aconteceu quando Kruschev (que fora perseguido por Beria) iniciou a "desestalinização".
O PCP e, em particular, Cunhal sempre fizeram da "disciplina" um dos esteios essenciais do seu "modus operandi": por uma questão de estilo, mas também de sobrevivência.
Ora, se os ventos que chegavam da URSS de Kruschev (russo, mas criado na Ucrânia) eram anti-Estaline (georgiano), claro que a "disciplina" obrigava a um certo afastamento do estalinismo. Tudo como sempre, portanto: a adoração do Diktat - o novo diktat.

É esta a verdadeira explicação para a existência de edições do "Avante" que evidenciam o afastamento em relação a Estaline. Mas essas edições são contemporâneas ou posteriores ao período em que Kruschev imperou (e ao V Congresso do PCP).
Não foi muito difícil ao PCP, quando o quis fazer, demarcar-se, mais ou menos vincadamente, do estalinismo. Tudo porque o estalinismo (e a evidência dos seus crimes atrozes, sobretudo na própria URSS) não constituía nenhuma "ideologia" (nem nunca Estaline perdeu tempo com devaneios "ideológicos"). O estalinismo era uma mera doutrina de acção: um modo de exercer o poder.
O estalinismo serve tanto a um totalitarismo de esquerda, como a um totalitarismo de direita. Conclusão: o PCP não teve que fazer uma inflexão verdadeiramente ideológica de cada vez que lhe interessou demarcar-se de Estaline. Era relativamente fácil. Isso já não é assim com Lenine; por isso é que nunca sucedeu".
Da próxima vez que falar sobre estalinismo, contarei aqui a única experiência estalinista a que assisti "in loco".
O estalinismo ainda existe em Portugal - até em pequenos redutos (amargurados) de poder(zito). Na minha experiência, envolveu o "julgamento" (moral, obviamente, como o estalinismo recomenda) de uma mulher grávida, à frente de "todos", com convite expresso à sua condenação generalizada (tinha-se "portado mal"). Com a receita completa: uma prédica inicial de auto-elogio (da "envergadura moral") do líder(zeco), seguida da palavra a circular pelos sequazes.

E, sim, foi em Portugal. Numa instituição pública. Em 2010.
Um mimo. Oxalá arqueológico. Mas inesquecível.